quarta-feira, abril 15, 2009

COLABORAÇÃO DA AMIGA NILZA MARIA!


A Executiva
Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou. Deu um gemido e apagou. 

Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso Portal.

Ainda meio zonza, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas.Todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. 

Sem entender bem o que estava acontecendo, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:

- Enfermeiro, eu preciso voltar urgente para o meu escritório, porque tenho um meeting importantíssimo. 

Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque meu convênio médico é classe A, e isto aqui está me parecendo mais um pronto-socorro. Onde é que nós estamos?

- No céu.

- No céu?...

- É.

- Tipo assim... o céu, CÉU...! Aquele com querubins voando e coisas do gênero?

- Certamente. Aqui todos vivemos em estado de gozo permanente.

Apesar das óbvias evidências de nenhuma poluição, todo mundo sorrindo, ninguém usando telefone celular, a executiva bem-sucedida custou um pouco a admitir que havia mesmo apitado na curva.
Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que
aquela situação era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana ela iria receber o bônus anual, além de estarfortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa.
E foi aí que o interlocutor sugeriu.
- Talvez seja melhor você conversar com Pedro, o síndico.

- É? E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?

- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.

- Assim?

(...)

- Pois não?
A executiva bem-sucedida quase desaba da nuvem.

À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.

Mas, a executiva havia feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu rapidinho:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século você veio?
- Do 21. O distinto vai me dizer que não conhece o termo 'executiva'?

- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight:

A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro. Se você me permite, eu gostaria de lhe fazer uma proposta. 

Basta olhar para esse povo todo aí, só batendo papo e andando a toa, para perceber que aqui no Paraíso háenormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistêmica.

 - É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reengenharia. Por exemplo, não vejo ninguém usando crachá.

Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Entendeu o meu ponto? Sem controle, há dispersão. E dispersão gera desmotivação.

Com o tempo isto aqui vai acabar virando uma anarquia. Mas nós dois podemos consertar tudo isso rapidinhoimplementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um organograma funcional,

nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver.
- !!!...???....!!!...???...!!!
- Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e
estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Acionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Ótimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias high-tech, 
redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, me parece extremamente atrativo.
- Incrível!

- É óbvio que, para conseguir tudo isso, nós dois teremos que nomear um board de altíssimo nível.

Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias de praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho certeza de que você vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar em um turn-around radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que você terá um futuro brilhante... se for trabalhar com o nosso concorrente.

Porque você acaba de descrever, exatamente, como funciona o Inferno...

Max Gehringer
(Revista Exame)

 

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